filmes sobre trabalho

Dez filmes sobre trabalho

Última atualização: 01/05/2021

Desde seus primórdios, o Cinema se interessa por todas as formas de trabalho humano. Portanto, é interessante acompanhar a sensibilidade dos realizadores de filmes que manifestam, como ficção, as relações trabalhistas horizontais – entre colegas – e verticais – entre patrões e empregados. Além disso, essa sensibilidade também diz respeito a como as relações de trabalho, legalizadas ou não, foram mudando ao longo dos anos.

Essa mudança é atravessada por transformações históricas e sociais profundas, para o bem ou para o mal das sociedades. Assim, há o entrelaçamento das grandes categorias sociais: classe, raça e gênero. Temos também conquistas e perdas de direitos, e seus efeitos sobre a vida das pessoas. Há também formas encontradas para se lidar com elas.  Por essa razão, os filmes sobre trabalho abaixo abordam alguns desses fatores – e alguns deles abordam todos ao mesmo tempo.

Tempos Modernos, de Charles Chaplin (1936)

O gênio Chaplin realizou esse clássico eterno em plena emergência do capitalismo industrial. Nesse sentido, o filme mostra um dado presente nas ciências sociais: os modelos econômicos precisam de uma construção de subjetividades específicas para terem sucesso. Acima de tudo, Chaplin já sabia que o trabalhador das grandes fábricas precisava se tornar expert em apenas uma ação, inviabilizando-se para qualquer outra atividade profissional.

Seu protagonista, sempre Carlitos, é vítima da fragmentação do conhecimento exigido para o trabalho na efervescente indústria do início do século vinte. A par disso, é também afetado pela quase inexistente legislação trabalhista à época, que praticamente o transformou em escravo. Entretanto, com todos esses elementos por si relevantes, Tempos Modernos também mostra que o ser humano é sempre mais rico do que os rótulos e modelos impostos pelos grandes patrões, já que Carlitos em momento nenhum se adaptou às regras que lhe impuseram. Disponível no Telecine Play.

Tempos Modernos filmes sobre trabalho

Norma Rae, de Martin Ritt (1979)

Filme que praticamente inaugurou, no cinema estadunidense, a discussão de gênero articulada à temática trabalhista. Por isso, talvez, as consequências de Norma Rae ser uma militante feminina da causa da instituição de sindicatos nos Estados Unidos não foram muito exploradas. Porém, já estão lá problemas básicos abordados pelo feminismo, como por exemplo a definição de papeis sexuais distintos para mulheres e homens e a dupla jornada de trabalho.

Sally Field levou o Oscar de Melhor Atriz pela interpretação de uma operária que abraça a ideias de que a sindicalização melhora as condições de trabalho nas indústrias. Em consequência, ela enfrenta a moralidade reacionária de sua cidade e luta para se fazer respeitar como pessoa, e não por seu comportamento sexual. Seu  trabalho no filme é tão relevante, que muitos críticos relacionam Norma Rae a outros filmes em que mulheres assumem a liderança em movimentos por direitos sociais. Disponível no Telecine Play.

Norma Rae

Germinal, de Claude Berri (1993)

O livro de Émile Zola trata das condições de trabalho das minas na França no fim do século 19. Nesta obra da nossa lista de filmes sobre trabalho, Claude Berri transporta o caráter naturalista do trabalho de Zola para a adaptação cinematográfica junto com o peso social do tema. O trabalho nas minas é exercido em condições miseráveis. Não há idade mínima para começar o serviço. E a insensibilidade dos patrões chega a ser insuportável.

O filme nos permite supor que a violência nas relações de trabalho – a exploração das horas trabalhadas, o assédio moral, físico e sexual, o salário injusto – estavam presentes na gênese da concepção moderna de trabalho. Antes, o que ocorria é que não havia ainda um arcabouço conceitual para as pessoas compreenderem e nomearem a violência que sofriam. Por isso tudo, Germinal é um filme historicamente importante. Além disso, é imprescindível ler o livro que lhe serviu de inspiração.

Germinal

Billy Elliott, de Stephen Daldry (1993)

Este delicado filme aborda não o trabalho propriamente, mas sim os padrões sociais relacionados a gênero e profissão. O menino inglês Billy Elliott (um jovem Jamie Bell), filho de operário, demonstra talento para o balé. Mas seu pai, generoso mas temeroso de que o menino se torne gay, e mais temeroso ainda da opinião dos outros, não sabe o que fazer. Além disso, o próprio Billy também enfrenta preconceitos em sua escola.

Os padrões rígidos de comportamento sexual ficam evidentes numa região operária da Inglaterra, onde a masculinidade está diretamente ligada à capacidade do homem de prover materialmente sua família, bem como educar seus filhos de acordo com a moralidade vigente. Por isso, a crise emocional  que o pai de Billy experimenta diante do talento do filho é mais um dos elementos cativantes do filme. Sem contar, claro, o próprio Billy, menino cheio de sonhos e alegria. Disponível para aluguel no YouTube.

Billy Elliott

Donnie Brasco, de Mike Newell (1997)

Este é um dos filmes sobre trabalho que melhor retrata no cinema estadunidense a dureza da vida de um policial infiltrado. A história é a de um policial (Johnny Depp) que se infiltra na máfia novaiorquina. Mike Newell prolonga ao máximo as situações de alto risco por que Brasco passa. Isso causa no espectador a tensão máxima. Dessa maneira, lhe permite compreender em grande medida o que diariamente afeta a vida de quem se junta às forças policiais.

Além desses apertos, a vida pessoal de Brasco acaba sendo afetada pelo abalo emocional que ser um policial infiltrado lhe causa. Os efeitos da falta de um lugar onde possa recalibrar-se emocionalmente dá uma ideia do que é viver em perigo 24 horas por dia. O filme se baseia na vida de um policial que existiu. Se pensarmos que estamos assistindo a um recorte dessa vida, já dá para imaginar porque muitos policiais em todos os países colapsam emocionalmente. Disponível para aluguel no YouTube.

Donnie Brasco

Ou tudo ou nada, de Peter Cattaneo (1997)

Mais um dos filmes sobre trabalho que abordam as questões de gênero relacionadas à precarização do trabalho masculino e ao desemprego. O eixo do filme está na angústia dos homens que perderam seus postos de trabalho e na alternativa de ocupar lugares sociais antes destinados às mulheres. Numa Inglaterra em desindustrialização no fim do século vinte, os homens precisam se contentar com o que restou para eles, se quiserem ter seu próprio dinheiro.

Gaz (Robert Carlisle), sem sequer conseguir pagar a pensão de seu filho, imagina a possibilidade de se reunir com outros homens também desempregados e organizar um show de striptease. Assim, para atrair mais público, o grupo oferece, como diferencial, uma apresentação com nu total e frontal. Com isso, a divertidíssima trama envolve um grande desafio para homens acostumados a reconhecer sua masculinidade através da proeminência na família, e não de sua aparência.

Ou tudo ou nada

O diabo veste Prada, de David Frankel (2006)

Grande sucesso de público principalmente por conta da atuação inesquecível de Meryl Streep em uma versão ficcional de Anna Wintour, a todo-poderosa Editora-chefe da revista de moda Vogue. De fato, sua Miranda Priestly era o diabo como chefe: assediadora, arrogante, exploradora. Mas também era terrivelmente competente, e trabalhar para ela significava aprender muito sobre o mundo da moda e conhecer muita gente importante.

Essa dualidade torna O diabo veste Prada singular nesta lista de filmes sobre trabalho. Sua funcionária Andy Sachs (Anne Hathaway), embora sofresse o cão com os horários, exigências e humilhações de Priestly, sabia que estava em um lugar privilegiado em termos profissionais. Sua chefe poderia lhe abrir caminhos dentro do universo da moda como nenhum outro. Situações como essa não são raras, e fazem com que muitos trabalhadores suportem, por anos a fio, assédios de todos os tipos no ambiente de trabalho.

o diabo veste Prada filmes sobre trabalho

Que horas ela volta, de Anna Muylaert (2015)

Esse excepcional filme é uma das imagens mais perfeitas das conquistas sociais favorecidas pelas políticas públicas e educacionais dos governos do PT. O filme mostra como essas políticas afetaram as relações num âmbito familiar. A autoestima manifestada por pessoas que conquistaram acesso a bem sociais importantes acaba também inspirando seus familiares a desejar novos e mais amplos espaços de existência.

Val (Regina Casé) é uma empregada doméstica de uma família rica e vive a situação que por séculos aflige sua profissão no Brasil. Assim, tida como “quase da família”, sofre na pele a segregação social praticada por muitos nas elites brasileiras. Porém, a chegada de sua filha Jéssica, que assume uma atitude altiva diante dos patrões de Val, abala a estrutura de casa grande e senzala de seu local de trabalho. A crise e as rupturas são inevitáveis, mas Val se descobre fortalecida para enfrentar o futuro junto com Jéssica. Disponível no Telecine Play.

Que horas ela volta

O valor de um homem, de Stéphane Brizé (2015)

Filme pelo qual Vincent Lindon ganhou o prêmio de melhor ator em Cannes em 2016. O tema diz respeito a como o neoliberalismo e a precarização das leis trabalhistas afetam mais fortemente pessoas com mais idade. Therry Taugourdeau (Lindon) está desempregado e com muitas dívidas. Nas situações difíceis, Taugourdeau busca manter a dignidade pessoal, tentando ao máximo não colocar a necessidade de dinheiro à frente de seus valores morais.

Contudo, o emprego que finalmente consegue como segurança em um supermercado lhe exige mais insensibilidade do que é capaz de demonstrar. Lindon vive de forma magistral a tensão entre a necessidade de sobrevivência e a ética pessoal. Por isso, a forma como o ator deixa transparecer a presença e a pressão de uma estrutura social injusta sobre o personagem torna esse filme imperdível. Disponível para aluguel no YouTube.

O valor de um homem filmes sobre trabalho

Você não estava aqui, de Ken Loach (2019)

Do cineasta e ativista Ken Loach, este é um dos filmes sobre trabalho que menciona o aspecto mais proeminente da precarização do trabalho na economia neoliberal: a uberização, que é a eliminação total dos direitos trabalhistas e de qualquer obrigação do contratante dos serviços do trabalhador. Com isso, é o fim da folga remunerada, das horas extras, das férias. A mudança para pior vem com um crescente desrespeito pessoal do patrão para o empregado, e também entre empregados.

Ken Loach narra com perfeição o que o cientista social Jessé de Souza denomina “dignidade”. Em definição, é quando a pessoa cede completamente às condições sub-humanas dessa precarização para conseguir sustentar sua família, e mesmo assim orgulhar-se de si. Particularmente, a diferença entre Você não estava aqui e o filme anterior de Loach, Eu, Daniel Blake, é a narrativa de como a uberização também esgarça as relações de afeto familiares, em nome de uma vida limitada apenas à sobrevivência. Disponível no Telecine Play.

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