ASSASSINATO NO EXPRESSO ORIENTE DOSSIE SUDNEY LUMET

Assassinato no Expresso Oriente | Dossiê Sidney Lumet

Por Amanda Luvizotto
Última atualização: 08/06/2024

Assassinato no Expresso Oriente  (Murder on the Orient Express, 1974)

Roteiro: Paul Dehn, Anthony Schaffer

Elenco: Albert Finney, Ingrid Bergman, Lauren Bacall, Jacqueline Bisset

O estadunidense Sidney Lumet é provavelmente um dos cineastas mais injustiçados de sua geração, pois não recebeu o reconhecimento merecido ao longo de sua carreira. Foi agraciado com um Oscar honorário apenas em 2005, quase 50 anos após o lançamento de sua primeira obra, 12 homens e uma sentença (1957), e apenas seis anos antes de seu falecimento em 2011. Outros diretores contemporâneos, como Francis Ford Coppola, Martin Scorsese e Robert Altman, tiveram e têm uma carreira mais aclamada por prêmios e pela indústria, ainda que o trabalho de Lumet em nada devesse ao dos demais. Em 2015, a diretora Nancy Buirski lançou o documentário By Sidney Lumet, em que apresenta uma entrevista filmada em 2008 na qual o próprio Lumet fala sobre a sua trajetória.

A obra de Lumet se caracteriza pela forte direção dos atores em cena, o meticuloso uso da câmera e as fortes narrativas apresentadas, em sua grande maioria situadas na cidade de Nova Iorque, e pelos temas constantes da corrupção, do racismo e da fragilidade do sistema judicial. Em 1974, Sidney Lumet estreia nos cinemas Assassinato no Expresso Oriente, adaptação da conhecida obra literária homônima da mundialmente famosa escritora britânica Agatha Christie, publicada em 1934. O filme é uma das diversas adaptações cinematográficas realizadas a partir das tramas de mistério escritas pela autora ao longo dos anos. A mais recente, A noite das bruxas (2023), é a terceira dirigida pelo irlandês Kenneth Branagh, em que o cineasta também interpreta o icônico detetive Hercule Poirot.

ASSASSINATO NO EXPRESSO ORIENTE DOSSIE SUDNEY LUMET

 

A adaptação assinada por Lumet é uma produção britânica, cujo roteiro foi escrito por Paul Dehn. O elenco notável conta com nomes como Albert Finney, Lauren Bacall, Ingrid Bergman, Jacqueline Bisset e Sean Connery. O filme foi bem recebido pelo público e elogiado pela própria Agatha Christie, que infelizmente viria a falecer dois anos após o seu lançamento. A obra também agradou à crítica e recebeu inúmeras indicações a prêmios, incluindo dez BAFTAs, vencendo três deles, e também concorreu a seis Oscars, em que Ingrid Bergman ganhou a estatueta de melhor atriz coadjuvante por sua interpretação da personagem Greta Ohlsson.

A trama acontece no ano de 1935, durante uma viagem no Expresso Oriente, trem cuja rota direta partia de Paris, na França, até Istambul, na Turquia. Uma nevasca impede o trem de seguir viagem, ficando parado em meio ao trajeto. Durante esse período, um homem é encontrado assassinado com 12 facadas dentro de sua cabine. O detetive Hercule Poirot é um dos passageiros, e a solução desse mistério fica sob sua responsabilidade. Durante sua investigação, realizada por meio de interrogatórios individuais dos passageiros e tripulantes, Poirot descobre a ligação do crime investigado com um caso de sequestro e assassinato de uma criança, ocorrido anos antes, nos Estados Unidos.

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No desenrolar da história, os valores éticos e morais e o senso de justiça do espectador são provocados; o mesmo acontece com o próprio detetive Poirot, conhecido por seu compromisso com a verdade, em seu desfecho. Um fato curioso, que merece ser citado, é que a escritora se baseou em um caso real, ocorrido em 1932. Um dos motivos especulados é que Agatha Christie teria escolhido um crime real propositalmente, para instigar seus leitores. A trama suscita a reflexão acerca dos conceitos de vingança e justiça, traduzidos na fala de Poirot “um assassino repulsivo foi, talvez, merecidamente assassinado”.

Sidney Lumet consegue explorar bem o clima de mistério característico das obras da escritora, ainda que flerte, em alguns momentos, com a comédia. O tom cômico deve-se, em grande parte, ao Poirot de Albert Finney, que começa caricato e, embora encontre o tom “certo” do personagem ao longo dos 128 minutos de exibição, foi bastante criticado à época, e ainda é atualmente. O primeiro ato se prolonga mais que o necessário, com uma meticulosa ambientação e apresentação dos personagens, mas, uma vez que o público tem sua atenção fisgada pelo mistério, o filme ganha ritmo e desenvolve bem sua narrativa. Um ponto alto são os efeitos de câmera escolhidos por Lumet para sinalizar as cenas ocorridas no passado, os chamados flashbacks, essenciais para o entendimento do enredo.

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Assassinato no Expresso Oriente já foi adaptado para os cinemas outras duas vezes: em 2001, com direção do sueco Carl Schenkel e com Alfred Molina como Poirot, e, em 2017, a primeira das adaptações de Agatha Christie assinadas por Kenneth Branagh. A última talvez seja a mais desnecessária de todas elas, uma vez que pouco acrescenta às versões anteriores, e parece mais focada em satisfazer um desejo pessoal de Branagh – o ator já falou publicamente em diferentes ocasiões sobre seu enorme interesse em filmar as obras de Agatha Christie e também em interpretar Hercule Poirot – do que em ambientar a trama aos dias atuais ou apresentar uma leitura diferente da história. O cineasta também adaptou para os cinemas os livros Morte no Nilo (2022) e A noite das bruxas (2023), obras que infelizmente não agradaram ao público em geral ou aos fãs da autora.

É seguro afirmar que, dentre as adaptações realizadas, a entregue por Sidney Lumet é a mais bem-sucedida delas. Tal resultado se deve à linguagem autoral do diretor e também à maestria com que trabalha seus atores e atrizes em cena. Um talentoso realizador, cuja extensa obra cinematográfica – 55 filmes lançados – merece ser conhecida e enaltecida.

Encontre os demais textos do Dossiê Sidney Lumet em nosso editorial.

Amanda Luvizotto é arquiteta, crítica de cinema formada pela Academia Internacional de Cinema do Rio de Janeiro. Integrante do grupo Mulheres no Terror, estuda sobre o papel da mulher no cinema e tem na leitura um de seus grandes prazeres. Estudante de cinema e eterna fã e defensora de Xavier Dolan. Acompanhe o trabalho de Amanda em suas redes sociais.

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