Histórias de Meu Pai
Última atualização: 17/02/2023
Arriscando que dizer isso seja uma obviedade, há em Histórias de Meu Pai uma perpétua estranheza por toda parte. Há estranheza na atuação de Benoît Poelvoorde (Coco antes de Chanell), há algo de estranho na direção de Jean-Pierre Améris (O Homem que Ri, Românticos Anônimos) e, definitivamente algo de estranho no romance em que se baseia este filme, de Sorj Chalandon. Nada disso é efetivamente um problema.
O filme avança valendo-se dessas estranhezas para instigar e cativar o público. A própria sinopse já faz isso. Na trama, André Choulans (Benoît Poelvoorde) é um homem que tem diversas profissões, e é idolatrado por seu filho de 12 anos, especialmente depois de se tornar conselheiro de Charles De Gaulle. Quando acha que foi traído por ele, pede ajuda ao garoto para matar o general.
Perigos da inocência
Essa premissa que soa estranha, enigmática até, esconde temas profundos e dramáticos que não são compreensíveis aos olhos de uma criança, olhar que o filme adota para nos contar esta história.
Em outras palavras, a escolha de adaptar apenas a primeira parte do romance autobiográfico de Chalandon, parte esta dedicada com boa dose de ludicidade madura à sua infância, o filme evoca ao mesmo tempo um ar infantil e encantador e uma tensão que nunca esmaece, já que a criança não reconhece os perigos em que se encontrada envolvida. Contudo, esse desafio não seria capaz de ser transposto na tela sem o talento do ator infantil Jules Lefebvre, excelente no papel do pequeno protagonista, Emille.
Ao passo que o filme avança, o que a princípio parece uma brincadeira ao menino vai se tornando cada vez mais perigoso e com consequências mais assustadoras. O tom conspiracionista, xenofóbico e violento do pai vai se evidenciando e se mistura em uma figura de complexidade psicanalítica.
Extremismos
Repleto de comentários sobre a questão extremista contra os franco-argelinos nos anos 60 que varria a França, o filme mostra como o extremismo de André influencia o filho e envolve o seu amigo de classe de família argelina para o olho do furacão.
Tomando o pai como exemplo, Emille mente, engana e trama, até se tornar um eco do pai em sua violência. O filme aí mostra seus contornos de drama, evidenciando o caminho que o menino está trilhando e a possibilidade de sair dele enquanto há tempo. No caso, isso ocorre pela intervenção das autoridades que leva ao desfecho do filme, muitos anos depois, e até a chave de leitura que oferece.
Longe de ser perfeito, mas repleto de oportunidades de reflexão. Histórias de meu pai é uma produção competente e capaz de transmitir suas ideias, mas que logo será esquecida. Isso porque sua estranheza nunca incomoda ou encanta o bastante. Bem como as próprias estranhezas de nosso mundo cotidiano tão comum.
Direção: Jean-Pierre Améris
Roteiro: Jean-Pierre Améris
Edição: Anne Souriau
Fotografia: Pierre Milon
Design de Produção: Pascaline Pitiot
Trilha Sonora: Quentin Sirjacq
Elenco: Benoît Poelvoorde, Audrey Dana, Jules Lefebvre, Tom Lévy, Nicolas Bridet, Martine Schambacher
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