Longlegs: Vínculo Mortal

Longlegs: Vínculo Mortal foi o meu primeiro contato com o diretor nova-iorquino Osgood Perkins. O filme me trouxe um impacto bem positivo logo na primeira cena, em que Perkins utiliza de posicionamentos de câmera escondendo a fisionomia uma das figuras, criando um clima tenso e ansioso e potencializando isso com um dos personagens em cena sendo uma criança. Nessa cena, o diretor reduz a razão de aspecto da tela, colocando os personagens mais próximos. Mas também essa é uma técnica do diretor para indicar em que tempo aquela cena se passa: se é nos anos 90, ou se passa há alguns anos.

Na história, a agente do FBI Lee Harker (Maika Monroe) assume a reabertura de um caso arquivado de um serial killer. Conforme desvenda pistas, Harker se vê confrontada com uma conexão pessoal inesperada com o assassino, que a lança numa investigação atmosférica.

O filme é montado e dividido em partes, sendo cada uma delas definida basicamente como um portal de conhecimento da protagonista. A cada transição entre as partes, a personagem entende mais sobre si, e isso a faz conseguir vislumbrar fenômenos de intuição que ela mesma questionava: como ela conseguia informações essenciais para o caso sem nenhuma explicação lógica?

Antagonismos imagéticos em Longlegs: Vínculo Mortal

Na construção de personagens e seu envolvimento em relação ao mundo a seu redor é que vejo o filme brilhar. Acompanhamos a agente Lee em ambientes fechados, com cores predominantemente neutras, cenários que se mostram quase como uma prisão disfarçada. Isso deixa a personagem confusa e limita seus sentimentos, pois ela se mostra muito apática e inexpressiva de início, fria ao ver seu companheiro baleado na cabeça e seguir em busca do suspeito, por exemplo.

O protagonista Longlegs (Nicolas Cage), entretanto, se apresenta em ambientes abertos, onde coloca em prática todo o voyeurismo que faz parte de sua personalidade. É um homem que se aproxima aos poucos: de início, a câmera procura esconder seu rosto, fazendo com que Cage use de toda sua versatilidade física na atuação. Mas o personagem também transita em cenários fechados, e é neles que ele mantém sua devoção em prática, orquestrando para dar poder a sua divindade.

Nesses momentos mais intimistas do personagem, vemos Cage construir uma atuação bastante afetada, conseguindo entregar um personagem absolutamente insano, mas também lúcido de seus atos, um psicopata que vive para corromper e destruir almas, fortalecendo as trevas que o acompanham.

Um filme que honra a tradição, e mais

Existe em Longlegs: Vínculo Mortal  uma clara homenagem aos thrillers policiais dos anos 90 do cinema norte-americano, principalmente os mais famosos, como O Silencio dos Inocentes e Seven: Os Sete Crimes Capitais. Mas o filme não se limita a isso, e sua atmosfera segue por um caminho que vai em frente ao terror, assume uma narrativa mais sombria e trabalha com planos que buscam explorar cada vez mais a insanidade dos personagens.

 

Um bom exemplo disso é a cena em que Longlegs segue de carro gritando palavras como “mamãe e “papai”, até haver um corte seco que se acompanha do som agudo do grito do personagem, cedendo lugar ao o plano em que Lee está presente. Assim, as insanidades de ambos se ligam diretamente.

Longlegs: Vínculo Mortal chega em no ápice de seu terror justamente quando Lee tem o discernimento completo de suas memórias e do que ela realmente significa para toda aquela situação. É quando o filme assume sua estética satânica, utilizando-se sim de certas soluções abstratas de roteiro. Mas sua frontalidade ao terror é muito bem desenvolvida, indo para uma investigação complexa, com soluções intuitivas da protagonista (que são justificadas), que levam a trama a uma montagem que investe no sobrenatural, e colocando figuras sombrias em segundo plano. E, mesmo que a reviravolta não seja das mais complexas ou brilhantes, Longlegs: Vínculo Mortal  é muito competente e honesto em relação a todo o desenvolvimento e ligação dos personagens.

Longlegs: Vínculo Mortal tem as melhores referências

Vejo também no filme bastante inspiração em A Cura (1997), de Kiyoshi Kurosawa, que também tem todo o clima investigativo característico dos anos 1990, mas assume planos sombrios e aterrorizantes, usando das sombras para representar o delírio sobrenatural que nos mergulha em uma atmosfera característica do j-horror.

Longlegs: Vínculo Mortal me agrada muito pela sua transição fluida da homenagem aos thrillers policiais dos anos 90 para o terror frontal que não se nega em ser terror, não usando de jumpscares baratos. Longe disso: investe numa atmosfera complexa, que cria prisões espirituais para cada um de seus personagens. Nesse sentido, o filme vai pelo caminho contrário do chamado “terror psicológico”, sendo honesto com tudo que se propôs em imagem e explorando o paranormal.


Ficha Técnica
Longlegs (2024) – Estados Unidos
Direção: Osgood Perkins
Roteiro: Osgood Perkins
Edição: Graham Fortin, Greg Ng
Fotografia: Andres Arochi
Design de Produção: Danny Vermette
Trilha Sonora: Elvis Perkins
Elenco: Nicolas Cage, Maika Monroe, Blair Underwood, Alicia Witt

 

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