A busca pela memória em Diálogos com Ruth de Souza, Neirud e No Cemiterio do Cinema
Última atualização: 20/06/2023
Um assunto recorrente nas produções exibidas no Olhar de Cinema é a memória. Nesta 12ª edição do festival assisti, até agora a três filmes que resgatam ou buscam resgatar a história de pessoas e/ou de seus feitos.
Cada título a sua maneira traça uma rota de investigações sobre seus objetos de pesquisa. Como resultado, apresentam ao público o resultado dessa procura em longa metragem.
Menos diálogos do que o esperado
Diálogos com Ruth de Souza, de Juliana Vicente, que integra a Mostra Exibições Especiais, parte de uma pesquisa de uma década sobre a carreira da atriz negra que da nome ao filme. Contando com inúmeros registros de arquivo, como entrevistas gravadas no apartamento de Ruth ou imagens e material jornalístico. Em meio às imagens das conversas com a atriz, Juliana insere imagens lúdicas. Desta maneira, as representações dialogam com uma linha de raciocínio que reflete sobre a ação do tempo na vida da atriz.
Estas são imagens referenciando os orixás e como cada um deles acompanharia Ruth de Souza ao longo de sua vida, são muito bem dirigidas, fotografadas e encenadas. Entretanto, talvez, o ideal seria que essa bela manifestação da relação entre uma pessoa e seus guias espirituais existisse a parte, como um outro filme de curta ou média metragem.
A inserção dessas imagens no filme rompe com o ritmo do documentário e limita o diálogo proposto no título. São muitas as interrupções e o tempo dedicado a forma lúdico eclipsa uma história tão forte, marcante e importante de ser assistida.
Quando menos é menos
Um outro filme do segundo dia de Olhar, Neirud, de Fernanda Faya, investiga o passado da tia da diretora. Também uma mulher negra, mas uma mulher negra sem registros de sua história. A tia ‘Neru’, uma incógnita, tem sua história perseguida pela sobrinha-neta afetiva. Assim sendo, alguns caminhos conduzem a narrativa pela história dos circos no sul e Nordeste do Brasil.
Infelizmente a ausência de dados sobre a vida de Neirud coloca a direção em um labirinto do qual ele não consegue sair. O que poderia ser um trabalho sobre a ausência das informações, sobretudo uma reconstrução idealizada de um legado da mulher circense permanece vazio, mas de uma maneira incômoda. Ao fim, me fica a sensação de que o laço de afeto entre as partes envolvidas não era tão sólido quanto o que foi apresentado na introdução do filme.
E, veja bem, a tia ‘Neru’, fascinante, cativa o espectador que carece de saber mais sobre ela. Ainda que esse mais fosse uma mentirinha, forjada pela memória afetiva infantil, de alguém que projetava naquela figura o ideal de super heroína. Este filme compete na Mostra Competitiva Brasileira.
Por um legado palpável
O que falta em um filme que é criatividade, sobra no outro. E eis que, em contraponto, No Cemitério do Cinema, da Mostra Competitiva Internacional lida com tranquilidade com as ausências de sua procura. O diretor, Thierno Soulemayne Diallo, faz sua caminhada descalço, no sentido literal. O jovem guineense inicia sua saga em busca de um filme perdido, do ano de 1953, dialogando com os temas memória, registro e preservação.
Em seu caminho sensível o solitário realizador (re)escreve o legado cultural e político de sua nação a medida que dialoga com autoridades do assunto, bem como ao se envolver com a comunidade. Antes de tudo, a força de sua produção reside no entendimento que uma história, enquanto memória, ocorrendo fora dos locais hegemônicos sempre passará por apagamentos e, cabe também àqueles que a vive, perpetuar sua existência.
Acompanhe a cobertura do 12° Olhar de Cinema aqui.
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