Mães de Verdade

Última atualização: 17/05/2021

A cineasta nipônica Naomi Kawase retrata em suas obras relações sociais e familiares. Seu filme mais recente, Mães de Verdade discute as pressões sociais sobre a maternidade no contexto japonês. A obra se perde um pouco por adicionar muitas informações nas subtramas, além de usar do melodrama para contar essa emocionante narrativa.

Entretanto, um dos pontos positivos da abordagem de Kawase é o desfecho, que poderia beirar a tristeza, mas opta por afirmar a empatia entre duas distintas mulheres.

A honra como motivador da maternidade ou de sua negação

Diferente de filmes que idealizam a maternidade como um conto de fadas da Disney, Mães de verdade aborda duas faces do exercício de ser mãe. Enquanto, por um lado, acompanhamos o casal Kurihara, que deseja uma criança e não consegue, do outro temos a adolescente Hikari (Aju Makita) encarando uma gestação sendo tão jovem.

Imagem do filme Mães de Verdade

O roteiro e direção de Kawase ressaltam os tabus de sua sociedade, tabus estes que também pertencem a outras culturas. Como exemplo desses tabus, cito os machismos presentes nas situações que tangem as perspectivas das maternidade, sendo um deles a tristeza e humilhação sentidas por Kiyokazu Kurihara (Arata Iura) ao se descobrir estéril. Em seguida, o homem conversa com um amigo, ambos embriagados, se colocando em um lugar de menosprezo por não serem capazes de gerar um filho.

Outra situação é a escolha da família de Hiraki em escondê-la da comunidade, isolando-a em um abrigo que acolhe mulheres que não desejam ou podem criar seus filhos, sendo que a jovem argumenta com eles que gostaria de criar seu bebê. Dessa maneira, percebemos que não existe preocupação com a saúde física ou emocional da adolescente, mas apenas com a honra da família.

Como uma mãe deve ser

Além disso, em vários momentos do filme, o que vemos são idealizações de como uma mãe deve ser. Como resultado, as mães escolhidas para adotarem as crianças precisam escolher entre a maternidade e uma profissão. Não apenas a escolha de ser uma das provedoras da casa é negada, mas também a de ter uma vida sexual.

Cena do filme Mães de Verdade

Enquanto a gestação de Hiraki não pode ser descoberta pela comunidade em que cresceu, seu namorado tem a oportunidade de levar sua vida em frente. Nesse hiato, os seis anos que se passam entre a adoção da criança e a descoberta de seu paradeiro pela mãe biológica, vemos a jovem exercendo a maternidade em relações de amizades.

Provavelmente, a tentativa foi mostrar que esse amor que não foi canalizado para seu filho levou aquela mulher a direcioná-lo para terceiros. Analogamente, Satoko Kurihara (Hiromi Nagasaku) vive à espera do momento em que suas escolhas levarão à perda da criança adotada, principalmente com o conflito no início do filme, em que um acidente entre as crianças sinaliza sua possível incompetência enquanto mãe.

Muitas voltas para um fim

Diferente de Projeto Flórida, que nos proporciona um incomodo constante ao desconstruir o ideal floreado de quem pode ou não ser mãe, Mães de Verdade propõe uma reflexão sobre a consequência desse ideal de maternidade e o fortalecimento de duas mulheres.

Halley (Bria Vinaite) não tem escolhas em sua narrativa. Sean Baker trata sua personagem sem vernizes que a embelezem por sua bravura, sequer por seus sacrifícios. Em contraste com essa personagem, Satoko e Hiraki são suportadas pelo melodrama. A cada passo de sua trajetória, suas dores as elevam ao patamar de exemplos de resiliência.

Mães de verdade, cena

A escolha de contar a história entrecortada por flashbacks partindo de duas subtramas que convergem para a trama principal, que é o possível encontro entre mães e filho, deixa o filme maior do que o necesário. Por vezes, se torna confuso e vagaroso.

Entretanto, o desfecho consegue se deslocar da sensação que é provocada pelos sofrimentos infligidos às personagens e surpreender de maneira delicada e positiva. Em suma, um final que exemplifica palavras como empatia e sororidade.


Ficha Técnica
Asa ga kuru (2020) – Japão
Direção: Naomi Kawase
Roteiro: Naomi Kawase, Izumi Takahashi, An Tôn Thât
Edição: Tina Baz, Yôchi Shibuya
Fotografia: Naomi Kawase, Yûta Tsukinaga, Naoki Sakakibara
Produção: Yumiko Takebe
Trilha Sonora: Akira Kosemura, An Tôn Thât
Elenco: Hiromi Nagasaku, Arata Iura, Aju Makita, Miyoko Asada, Reo Sato, Hiroko Nakajima

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