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Schumacher

Última atualização: 19/09/2021

Acredito que o mundo se divida em quatro grupos. O primeiro é o dos que não assistem à Formula 1 (convenhamos, deve ser o maior). Outro que “parou de assistir quando o Senna morreu”. Um que assiste à categoria atualmente e vê seus ídolos nas pistas a cada duas semanas e nas redes sociais em tempo real. E um último, que conheceu o esporte na época em Michael Schumacher se tornou o seu deus. Intocável. Inalcançável. Inigualável.

Faço parte deste último grupo. Lembro do fiasco em Jerez de la Frontera em 1997, da decepção de Suzuka em 1998 e da apreensão com o acidente de Silverstone em 1999, bem como da euforia na mesma Suzuka em 2000 e dos quatro anos seguintes, em que, com mais ou menos dificuldades, Schumacher alcançou marcas que pareciam imbatíveis. Só pareciam, uma vez que muitas delas hoje pertencem a Lewis Hamilton.

Mas por que falo tudo isso? Basicamente, porque a percepção de Schumacher, documentário da Netflix dirigido por Hanns-Bruno Kammertöns, Vanessa Nöcker e Michael Wech, está diretamente ligada a qual destes quatro grupos o espectador faz parte. Não consigo imaginar que alguém sem interesse na Fórmula 1 tenha interesse pela obra. Ao mesmo tempo, não vejo um “sennista” dando o braço a torcer da grandiosidade de Schumacher após ver o filme. E mesmo que um fã da Fórmula 1 moderna o assista, não creio que termine a sessão com a dimensão exata do tamanho de Schumacher.

Um traçado confuso

Duas corridas em Spa-Francorchamps, na Bélgica, dão início a Schumacher. Em 1991, o alemão estreava na categoria. Apenas um ano depois, vinha a primeira das suas 91 vitórias. Há depoimentos de testemunhas dessa jornada, como por exemplo Bernie Ecclestone, ex-CEO da Fórmula 1, Eddie Jordan, chefe da equipe por onde Schumacher estreeou, e Flavio Briatore, que imediatamente o contratou para a Benetton, equipe pela qual venceu em 1992 e ganharia seus dois primeiros títulos, em 1994 e 1995.

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Só que, fora estes relatos pontuais, o começo da carreira de Schumacher é um tanto quanto negligenciada. Surpreendentemente, a história espetacular envolvendo a prisão de Bertrand Gachot, que resultou na vaga na Jordan, ficou de fora. O pai de Michael, Rolf, chega a dizer que a vaga apareceu quando um piloto “ficou ausente”. Seria muito interessante, sem dúvida, ouvir o que Gachot tem a dizer sobre o que Schumacher fez com a oportunidade que ele, involuntariamente, lhe deu.

O filme prefere, entretanto, voltar à infância de Schumacher e depois pular para a temporada de 1994, que marca a morte de Ayrton Senna e o primeiro título do alemão. Neste segmento, são estabelecidas as bases do caráter de Schumacher que serão, posteriormente, as razões do seu sucesso. Por exemplo quando, pegando pneus jogados no lixo pelas crianças ricas, Michael montava karts e ganhava corridas.

Mas, inesperadamente, quando ouvimos o próprio Michael comentando sobre a morte de Senna, é quando o documentário cria um sentido novo para um material antigo. Ali, de forma involuntariamente profética, Schumacher fala de si mesmo: “o coma pode significar muitas coisas, pode ser algo de que você vai acordar amanhã ou algo de que você nunca vai acordar”.

Schumacher, embora não se saiba oficialmente, vive provavelmente em estado semivegetativo, decorrente de um acidente sofrido em 2013.

Schumacher é sobre trabalho duro e família

Mas o grande foco do documentário está mesmo nos anos de Ferrari. Principalmente, no trabalho duro que permitiu o domínio da escuderia de Maranello. De como Schumacher convertia derrotas em mais trabalho. Como era um agregador, um líder que motivava e inspirava o time. E como sua família era importante para Michael, que garantia a sua proteção. Nas palavras de sua esposa, Corinna, o importante era que eles estavam juntos.

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E é nos relatos de Corinna que o público sente o vazio deixado por Schumacher. Uma mulher que via no marido um protetor e, de uma hora pra outra, se viu obrigado a protegê-lo. As entrevistas são conduzidas de modo que fica claro o desgaste e o ressentimento pelo infortúnio do ex-piloto. Se Corinna comete alguns atos falhos e já se refere ao marido no tempo pretérito, o filho Mick, que chegou à Fórmula 1 este ano, demonstra um inconformismo gritante por não poder dividir suas novas experiências com o pai.

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Deixando muito da parte esportiva de fora, Schumacher não faz jus ao gênio que o piloto foi. E, ainda que de forma compreensível, não dá muitos detalhes sobre o seu atual estado. É um documentário fragmentado, referente a um tempo que já não existe mais e que só quem viveu ou testemunhou é capaz de entender.

Schumacher está disponível na Netflix.


Ficha Técnica
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Schumacher (2021) – Alemanha
Direção: Hanns-Bruno Kammertöns, Vanessa Nöcker, Michael Wech
Roteiro: Hanns-Bruno Kammertöns, Vanessa Nöcker, Michael Wech
Edição: Susanne Ocklitz, Michael Scheffold, Olaf Voigtländer
Fotografia: Reiner Bauer, Ilhan Coskun, Robert Engelke, Johannes Imdahl
Trilha Sonora: Peter Hinderthür, Christian Wilckens
Elenco: Corinna Schumacher, Bernie Ecclestone, Flavio Briatore, Ross Brawn, Jean Todt, Mika Häkkinen, Mick Schumacher

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