Guerra Civil: o papel da imprensa na construção da realidade

Última atualização: 18/04/2024

Alex Garland não acerta sempre, mas sempre é interessante ver e refletir sobre seus filmes. De modo geral, todos exigem um pouco mais de atenção do espectador, não entregando respostas simples para as muitas questões que coloca em tela. Além disso, há também o deleite que é acompanhar a boa condução que as escolhas de elenco do diretor produz em tela. Com Guerra Civil, isso acontece mais uma vez.

Na trama, em um futuro não tão distante, uma guerra civil se instaura nos Estados Unidos e uma equipe de jornalistas de guerra viaja pelo país para registrar a dimensão e a situação. Em meio a um cenário violento que tomou as ruas em uma rápida escalada, envolvendo toda a nação, eles pretendem atravessar o front de batalha com o objetivo de conseguir uma entrevista com o presidente, antes que ele seja deposto e certamente, executado.

 

Um olho na tela, outro na realidade

O filme presta referência ao fotojornalismo e ao papel necessário da imprensa em contar ao mundo o que o mundo é. Mas, para além do texto direto, aquele falado pelo elenco em diálogos, há também o diálogo que o cinema realiza com essa outra forma de mídia.

Embora alguns possam ver aqui algum sinal da pretensa isenção do jornalismo, o que o filme mostra e um recorte, como qualquer imagem da realidade também seria. A realidade é muito mais dura, como sabe a personagem Lee Smith (Kirsten Dunst) a cada vez que fecha os olhos. Embora se coloque como uma pessoa fria, no fundo demonstra estar ferida por presenciar tanta dor e violência em sua carreira.

O conflito pessoal aumenta, e parece mais interessante para o diretor do que o grande combate em tela, quando Jessie (Cailee Spaeny), se junta ao grupo e a força a lidar com questões éticas. Outros personagens engrossam o caldo da narrativa, como Joel (Wagner Moura) com suas ambições e o veterano repórter Sammy (Stephen McKinley Henderson) que tem seus próprios motivos para a viagem.

Embora tenhamos muitos acenos de que o motivo da guerra seria um motivo de critica à extrema direita trumpista, não podemos dizer que o filme se resumiria a isso. Como pode se visto nos parágrafos acima, o coração da história está nesses jornalistas e em como suas humanidades se manifestam. Assim, mesmo que haja aqui um exercício pessimista de futurologia, o estudo de personagens se sobressai.

 

Registrar para que outras pessoas façam as perguntas

A mistura é poderosa, transformando o filme em um drama de tensão crescente à medida que o grupo avança na estrada, mas retira do filme a possibilidade de um clímax mais intenso em seu texto do que na tela. Nos minutos finais, temos uma superprodução de guerra que inebria os sentidos com um trabalho de cenografia, efeitos e som fantásticos. Mas, tematicamente, o filme já tinha encerrado seus temas, pois poucas cenas antes todo o arco dos personagens já havia se fechado com uma explosão de emoção.

O filme parece autoconsciente disso, de modo que o diretor entrega uma fala vazia do presidente ao fim, depois dessa longa sequencia de guerra e destruição. Ao ser confrontado pelo personagem de Wagner Moura, o espectador não pode dizer se toda a viagem dos personagens valeu a pena. Temos de volta a tensão, da tela para a cadeira. “Isso basta”, diz o jornalista. E o filme acaba.

Publicado Por

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *